A visita do Presidente
João Bosco
Miquelão
Com o início de sua
construção, em 1957, a Usina de Três Marias era considerada pelo Presidente JK
como uma das mais importantes obras de seu governo.
A maior barragem de
terra do mundo àquela época tinha a função de regularizar a vazão do Rio São
Francisco, atenuando as terríveis enchentes que atormentavam periodicamente a
cidade de Pirapora. A conclusão da obra também propiciaria ao grande rio chegar
com pouca alteração de volume na região do Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso,
quer na seca, quer na época de chuvas.
Três Marias também
irrigaria o cerrado e geraria quase 400 mil kW, uma importante contribuição
para uma indústria que crescia e demandava energia elétrica desesperadamente.
O acampamento dos que
trabalhavam na obra era uma pequena cidade com comércio e dotado de vários
serviços essenciais - correios, corpo de bombeiros e até uma delegacia de
polícia e clube de recreação.
Depois de concluída a
obra, em 1962, todas as edificações e sua infraestrutura passaram a fazer parte
do distrito de Barreiro Grande, do município de Corinto, nome da localidade de
Três Marias antes de emancipar-se.
Mas, voltemos à época
da construção da grande usina. O acampamento dos norte-americanos era admirado
por sua beleza e organização. Cada casa era pintada com uma cor diferente, cada
uma ostentando um belo jardim e uma placa com o nome da família moradora – Rohrman’s, White’s, Mc Cormack’s
etc.
Durante o seu governo,
Juscelino fez várias visitas-surpresas ao canteiro de obras da usina. O administrador
geral da construção já ficava arrepiado quando via na mão do contínuo o
radiograma com a palavra urgente impressa em vermelho, uma mensagem que avisava
sobre o pouso do bimotor Beechcraft com uma antecedência que raramente excedia
30 minutos.
A correria era geral,
pois a visita do Presidente sempre coincidia com o horário de almoço, e o
frango com quiabo, prato predileto de Juscelino, não podia faltar.
Essas visitas do
Presidente continuaram cada vez mais frequentes até o final do seu governo em
janeiro de 1961.
Jânio Quadros não
chegou a visitar Três Marias nos sete meses em que governou.
Na programação para a
inauguração da grande obra, prevista para o dia 25 de julho de 1962, estava
acertada a presença do sucessor de Jânio Quadros, João Goulart.
A administração da obra
levou um enorme susto no dia 20 daquele mês ao receber um radiograma do
escritório de Brasília com a seguinte informação: “Favor colocar veículo à
disposição de João Goulart, que chegará ao aeroporto de Três Marias hoje, dia 20,
às 17 h”.
Todos fizeram a mesma
pergunta: por que o Presidente faria duas viagens a Três Marias num intervalo
de cinco dias?
E a correria foi geral,
como nos tempos de Juscelino. Pelo adiantado da hora, o Presidente certamente
iria jantar no acampamento e, provavelmente, até pernoitar no pequeno hotel de
visitantes.
Às 17 horas, pontualmente, o avião aterrissou
no aeroporto. A comitiva, composta pelo superintendente da obra, o delegado de
polícia e mais alguns funcionários graduados ficaram intrigados com um detalhe
fora do comum: por que o Presidente havia decidido viajar num monomotor, um
avião tão minúsculo?
E logo o mistério ficou
esclarecido: João Goulart, ao descer do avião, mostrou-se visivelmente
constrangido com aquela recepção, pois nunca tantas pessoas o haviam esperado
na chegada a uma obra. Afinal, ele, João Geraldo Esteves Goulart, era somente o
chefe do Departamento de Transportes da empresa.
--- Do livro Plinia
trunciflora e outras crônicas (MIQUELÃO, João Bosco. Niterói:
Alternativa, 2016 – ISBN 978-85-63749-57-4).